As duas comunidades já estão na lista das que ganharão Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), que somarão 40 até 2014. Assim, 850 mil habitantes se beneficiarão, diretamente, do policiamento comunitário. Até agora, 13 UPPs já foram implantadas na capital. Outras já estão garantidas, como a dos morros São João, do Quieto e da Matriz, no Engenho Novo, recentemente ocupados. As 40 unidades foram inicialmente planejadas pela Secretaria de Segurança para o município do Rio. Mas há um fator que vai alterar o produto: o êxodo de bandidos para favelas de Niterói, São Gonçalo e Baixada Fluminense. Com isso, o programa da polícia pacificadora vai se estender para fora da capital.
Traficantes de áreas ocupadas pelas forças de segurança migraram para favelas como Mangueirinha, em Duque de Caxias, e Salgueiro, em São Gonçalo. No primeiro caso, a comunidade recebeu bandidos da Vila Cruzeiro e do Alemão, que já costumavam frequentar os bailes funk locais. No caso do Salgueiro, a favela foi escolhida por sua proximidade com a Ponte Rio-Niterói, o que facilita a fuga. As duas favelas estão entre as comunidades com mais chances de ser beneficiadas pelo programa das UPPs. Com isso, pela primeira vez a Região Metropolitana será contemplada
- Estamos estudando a ampliação do projeto para a Baixada Fluminense e para São Gonçalo e Niterói. Ajustes e mudanças são realizados de acordo com a necessidade e a conveniência administrativa. Entretanto, os princípios básicos dessa política pública permanecem inalterados – afirmou o secretário de Segurança, José Mariano Beltrame.
O deputado Marcelo Freixo (PSOL), que presidiu a CPI das Milícias na Alerj e mora em Niterói, afirma que o avanço das UPPs para a Região Metropolitana era inevitável:
- Inicialmente, a instalação das UPPs atendeu a áreas valorizadas da capital: o corredor hoteleiro e o entorno do Maracanã. Esta segunda fase vai atender às consequências da primeira etapa. O importante é que não faltem investimentos.
Freixo afirmou que o avanço das UPPs não freou as milícias:
- As milícias não sofreram com a implantação das UPPs. Elas continuam crescendo.
Em resposta, Beltrame ressaltou que o combate às milícias é diferente do método adotado contra o tráfico:
- Milícia é bem diferente de tráfico. Milícia se combate com investigação e prisão. Já prendemos muita gente, desarticulamos a principal milícia do Rio.
Relatórios reservados dos serviços de inteligência da secretaria informam que a violência em São Gonçalo e Caxias cresceu em 2010. O fato pode ser comprovado quando se compara o número de roubos de veículos ocorridos em dezembro de 2009 com o do mesmo mês em 2010, nas delegacias de São Gonçalo, Neves e Caxias. Na primeira delegacia, o total de crimes pulou de 25 para 31 (um aumento de 24%). Em Neves, também em São Gonçalo, subiu 53%: de 19 para 29. Em Caxias, foram 142 roubos no mês passado contra 108 no mesmo período de 2009 (um aumento de 31%).
Segundo o subchefe operacional de Polícia Civil, delegado Rodrigo Oliveira, a migração de bandidos para a Baixada e São Gonçalo começou há cerca de um ano:
- Temos feito operações em qualquer favela. Prendemos dezenas de pessoas e outras até morreram. Hoje, entrar numa favela ficou bem mais fácil depois do Alemão, que era tido como porto seguro dos bandidos. Daí a importância do projeto das UPPs.
Enquanto a secretaria estuda alterações no planejamento, moradores de comunidades como Rocinha e Vidigal não veem a hora de entrar para o rol das favelas pacificadas. Durante o réveillon, eles sofreram com um ajuste de conta entre bandidos das duas favelas, da mesma facção.
Assista ao vídeo com o relato de um morador sobre o terror imposto por traficantes na Rocinha e no Vidigal
Morador há mais de 20 anos da região, X. conta que o assassinato de pelo menos seis pessoas na Rocinha e no Vidigal, no fim do ano, chocou a população das comunidades:
- A gente está triste, pois recebeu a “herança” das comunidades pacificadas. O pessoal do Alemão está todo escondido aqui dentro.
De olho no futuro, X. não suporta mais dar satisfação ao tráfico:
- Quem manda na vida dos moradores é o tráfico. Eles controlam tudo: as kombis, os mototáxis, a internet, o “gatonet”, o gás… São muitas pessoas que são cortadas e jogadas de lá de cima. Estamos cansados de ver isso. Nós queremos UPP lá dentro para resolver nossos problemas. O pior disso tudo é que a polícia que vai lá recebe dos bandidos. A gente não suporta mais conviver com isso. Só da Rocinha, eles levam R$ 70 mil. Os bandidos pagam melhor à PM do que o estado.
Fonte: O GLOBO
